Navegação
Relatório de Atividades | Ivone Gomes – um céu sem limites
542
post-template-default,single,single-post,postid-542,single-format-standard,ajax_updown,page_not_loaded,,select-child-theme-ver-1.0.0,select-theme-ver-4.4.1,side_area_over_content,wpb-js-composer js-comp-ver-5.4.7,vc_responsive

Ivone Gomes – um céu sem limites

É a terceira de seis irmãos e diz orgulhosa: “Sou do bairro de “Reno Gã Biafada”, em Bissau. Ivone chega à Rádio Sol Mansi determinada e de manhã já a podemos ouvir: “Bom dia! Bom dia!”. Difícil não sorrir a esta saudação irrequieta, impossível não passar para a cumprimentar. Com 46 anos faz contas à vida e explica-nos que a economia não foi a primeira escolha, mas o seu ser empreendedor marcou-a desde nova.

“Com quatro anos fiquei paralisada devido a uma injeção” e “a minha mãe levou-me para ser tratada em Canchungo”. Aí, vivendo com uma tia – “costureira de mão cheia” – foi alternando a vida entre o hospital, a escola e casa, começando a tecer o enredo de uma vocação. “Viver longe da minha mãe não foi fácil, mas isso ajudou-me a ser aquilo que hoje sou. Devo-o à minha mãe e à minha tia.” Em 1984 vem para Bissau concluir o primeiro ciclo e, após o término do liceu, dadas as escassas escolhas encontradas na altura a nível universitário, começa a trabalhar. Na Escola de São Paulo ensina cultura religiosa do 1º ao 6º ano, é professora de alfabetização para adultos e ainda monitora de corte e costura. Entretanto, as linhas com que vai cosendo o destino levam-na a desejar abraçar a consagração laical. “Mas eu e outras colegas queríamos viver um estilo de vida diferente das religiosas”, recorda. E com a sensibilidade e orientação de uma pessoa amiga que trabalhava na Caritas, Ivone entra em contacto em 1997 com a Companhia Missionária do Coração de Jesus, um instituto secular italiano com presença então em Portugal, em Moçambique, na Argentina e no Chile. Ivone consagrar-se-ia em 2004, sete anos depois, entregando-se a Deus e às causas para as quais se sente chamada, vivendo em comunidade no lar que se tornou seu, em São Paulo, e a vontade irresistível de continuar a aprender.

Créditos: Guto | Âmago

Não encontrando vagas em Comunicação Social na Universidade Amílcar Cabral, acaba por trocar a sociologia pela economia: “Na altura do ano propedêutico juntavam todos os alunos da área social e económica na mesma sala, por isso, enquanto estudávamos, fiquei a gostar mais da economia, pensando também já na minha profissão que era a costura”, partilha. Depois da universidade pensava assim em organizar a sua pequena empresa, mas, logo em 2009, último ano da universidade, dá-se a incorporação definitiva na Companhia Missionária e o diretor da Rádio Sol Mansi convida Ivone, após uma semana, para aí trabalhar como administradora financeira. Apesar de aceitar o desafio que – de forma concertada com a sua congregação – acaba por abraçar desde 2010, nunca abandona aquela que afirma ser a sua “profissão”, aliando a atividade de costura no tempo livre com o desejo de ajudar quem precisa, sobretudo as camadas mais vulneráveis.

Créditos: Guto | Âmago

A certo ponto, “decido criar uma associação de mulheres costureiras”, atira, num país onde a costura está ligada fundamentalmente ao universo masculino. No início “eram 60 mulheres”, mas, sem máquinas para treinar em casa, “acabaram por dispersar”. Hoje, estão envolvidas sete, lindas na sua diversidade, e que – com o apoio de organizações não-governamentais – crescem e forjam uma identidade. Beneficiando de formação, equipamentos e espaços de exposição, começam assim a ser “Bontche”, que se deverá formalizar como cooperativa ainda no primeiro semestre de 2018.

Enquanto artesã que integra a formação artística e de consolidação de planos de negócio em sala, a par de sessões de acompanhamento na conceção de novos produtos, ministrada pela FEC em parceira com a ENGIM, no âmbito do projeto Cultura i nô balur, Ivone conta que este percurso formativo, por um lado, ajuda-a a “organizar melhor o trabalho”. Por outro lado, “abre novos horizontes na minha vida e ajuda a divulgar o nosso trabalho.” Mas nada é por acaso. “Não devemos ter medo de arriscar, porque quem não arrisca não encontra resultados… devemos ter a certeza de que se arriscamos podemos vencer obstáculos e obter bons resultados”, desafia.

Créditos: Guto | Âmago

De tarde, Ivone dá-nos a ver o mundo da produção de roupas e acessórios onde aos 14 anos começou a envolver-se, já em Bissau e, cada vez mais, a partir de 1994, com a ajuda do padre Dionísio na Escola de São Paulo. Um mundo que a atraía já desde pequena, quando observava a precisão da tia. Confidencia o sonho de um dia poder retribuir cada ajuda que encontrou no seu caminho, formando também pessoas com deficiência. “Sozinha não poderei realizar esse sonho…”, diz com os olhos a brilhar e o seu jeito de quem tem pressa de viver. Impossível não olhá-la no fundo dos olhos. Ivone ama e não está sozinha.

Créditos: Guto | Âmago