“Este cenário inquieta-nos, mas não nos desalenta”. FEC quer trazer fraternidade às relações internacionais
Foi de forma resoluta e com ênfase na ação que a Diretora Executiva da FEC, Ana Patrícia Fonseca, encerrou o Colóquio “Fraternidade: Novo nome para a Paz”, no passado dia 10, no Auditório da Rádio Renascença, em Lisboa. No ano em que a Fundação celebra 35 anos de existência, o contexto internacional de crises múltiplas exige uma resposta que tenha por base a cooperação para o desenvolvimento, a coerência das políticas, o pensamento social da Igreja e a fraternidade universal.
“Bem baralhado, bem confuso e bem violento”. Foi assim que o D. José Ornelas resumiu, de forma sintética, o atual estado do mundo. Para o Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, existe a necessidade urgente de “refletir sobre a paz, novamente, e de renovar os fundamentos dessa paz”.
O sonho de um mundo melhor, nascido no pós-guerra fria, ruiu de forma vertiginosa com as transformações sociais recentes, desabafou o prelado português. “Fomos surpreendidos com o regresso de todos esses fantasmas e com o regresso de uma violência inaudita que não esperávamos ver”. Pior do que o conflito, constatou, “é a indiferença perante aquilo que acontece, perante o sofrimento, perante a destruição, perante a morte”.
O foco deve estar na construção da paz, mas não uma paz assente na força, em relações económicas e desequilíbrios de poder: uma paz superficial e a prazo. Como referiu o Presidente do Conselho de Administração da FEC, Jorge Líbano Monteiro, “a paz [verdadeira] só é construída quando olharmos uns para os outros e percebermos que os outros são nossos irmãos, quando percebermos que o nosso mundo é uma Casa Comum”.
“O momento é trágico”
O Bispo de Nampula, D. Inácio Saure, trouxe à discussão os desafios que o povo moçambicano enfrenta. Em particular, salientou a chamada “maldição dos recursos”, num contexto caraterizado pela promessa de megaprojetos de valorização de matérias primas, ainda por concretizar, e a corrupção, a violação dos Direitos Humanos e o aumento da pobreza.
A alteração da lógica de atuação da União Europeia, acompanhando um movimento mais lato dos atores internacionais, foi destacada pela Embaixadora Rita Laranjinha. “A preocupação de pôr a ênfase na cooperação e na ajuda foi evoluindo para uma lógica mais focada no que se chama as parcerias internacionais”.
Nesta nova lógica, a ideia central é que o doador deve ter algum retorno do investimento realizado junto dos países parceiros. Para Laranjinha, está mudança relaciona-se, em parte, com o contexto político atual, onde a segurança e a defesa emergem como preocupações centrais no contexto internacional.
A visão das ONG católicas foi trazida ao encontro por Bernd Niles, atual Presidente da CIDSE. Na perspetiva destas organizações, a prioridade é a solidariedade, a advocacia para derrubar as injustiças estruturais e o cuidado pela Casa Comum. Parafraseando o Papa Francisco, Niles recordou a necessidade de “ouvirmos o grito dos pobres e da terra”, isto é, de fazermos a ligação entre as injustiças sociais e a destruição ambiental.
Com olhos postos na sociedade civil, o responsável da CIDSE não deixou de referir a situação devastadora que os cortes orçamentais, em diferentes países, vão trazer aos esforços de desenvolvimento, sobretudo nos países mais pobres. “Estamos numa situação muito difícil”, sublinhou.
Mário Almeida, do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral do Vaticano, reforçou a gravidade do contexto. “O momento é o mais trágico desde a segunda guerra mundial. (…) O momento é trágico para a cooperação internacional e para a diplomacia da fraternidade”.
“A situação financeira não tem a última palavra”
Uma visão mais otimista do futuro da cooperação internacional foi trazida por Javier Gavilanes. Para o Vice-Presidente da CESAL e membro do Conselho de Administração da FEC, “pode-se fazer uma cooperação inteligente, útil, com impacto e olhando para as pessoas, sem depender exclusivamente do orçamento e dos recursos financeiros disponíveis”.
Segundo Gavilanes, este é o contexto em que somos chamados a “desenvolver a nossa vocação”, pelo que não nos devemos deixar desencorajar pelo ambiente negativo, mas antes avançar com uma perspetiva e atitude positivas. O caminho passa pelo conhecimento, pela coerência das políticas e pela utilização de métodos de trabalho vocacionados para as pessoas.
Lígia Figueiredo, do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, concordou com a orientação para o conhecimento, para as pessoas, e destacou a necessidade de pensar a médio e longo prazo. Não obstante a enorme pressão que existe sobre os orçamentos nacionais e a incerteza da conjuntura internacional, “a cooperação não pode ser feita a navegar a esta luz”, sublinhou.
Para a Diretora dos Assuntos Multilaterais do Camões, “tem de haver uma certa resiliência nestas apostas [da cooperação], sendo flexíveis o suficiente para se adaptarem aos diferentes cenários”. Os resultados da cooperação não são o fim do percurso. “Há um caminho e o caminho demora a fazer, e temos de ser resilientes e resistentes”.
Já Nelvina Barreto, participando remotamente a partir da Guiné-Bissau, destacou a importância de um desenvolvimento humano integrado, alicerçado na fraternidade, como condição para a segurança e dignidade das populações.
Para a Diretora do Serviço Clima e Sustentabilidade do PNUD em Bissau, “esta fraternidade, que cada vez mais se vai perdendo nos nossos dias, cria laços de solidariedade, de cooperação e de confiança mútua, que são essenciais para que tenhamos sociedades mais justas. A paz, não é somente fruto de condições materiais, mas também “dos vínculos humanos solidários que são alimentados pela fraternidade”.
Reforçando a ideia de uma atuação orientada, estratégica e globalizante e eficaz, Ana Patrícia Fonseca encerrou o evento destacando que “a cooperação para o desenvolvimento, a coerência das políticas, a pensamento social da Igreja e a fraternidade universal são poderosos instrumentos de solidariedade internacional, na resposta à erradicação da pobreza e às desigualdades sociais.”
O colóquio contou com a presença dos Bispos Católicos dos países de Língua Portuguesa, reunidos em Lisboa para o XVI encontro bienal das Igrejas Lusófonas. A ocasião foi destacada pelo Cardeal Patriarca de Lisboa, D. Rui Valério, que enfatizou a cultura e as histórias partilhadas entre os povos. “Estamos verdadeiramente próximos na fraternidade, na comunhão, quase que de destinos. E isto, graças a Deus, é um caminho não para o abismo, mas é um caminho para a paz”.
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