Comunidade de Massangulo
A Missão da Consolata está presente em Massangulo desde 1928. Disponibiliza largos espaços de cultivo para a população local, educação e água. O Pe. João Nascimento e a comunidade missionária têm cuidado a paisagem e os recursos da montanha com muito esforço e contra a crescente depredação.
“O meio ambiente é um bem coletivo, património de toda a humanidade e responsabilidade de todos. Quem possui uma parte é apenas para a administrar em benefício de todos.”
(LS 95)
Estamos na província de Ngauma, onde predominam as casas de adobe, caniço, paus maticados, capim e colmo e onde a energia mal chegou: só em dezembro de 2019, o Fundo de Energia (FUNAE) instalou uma minicentral solar fotovoltaica de Chissimbir, com capacidade para 100 famílias. À volta do distrito, predominam os pinheiros e eucaliptos. Segundo um relatório da Livaningo, são 3.332 hectares plantados por uma operação da Green Resources, que ocupa no total 9.740 hectares. Ao longo das poucas estradas que saem do distrito as vistas são largas, desabitadas e impressionantes. Massangulo é um lugar remoto, onde, ao longe, se avistam as montanhas do Malawi. Tal como do outro lado do lago Niassa, que divide os dois países, a maior parte da população é Ajaua (ou Yao) e Nianja (ou Chewa) e de maioria islâmica (95,8% segundo as últimas estatísticas). O convívio entre pessoas de diferentes religiões é fraterno, garante o Pe. João.
Em Massangulo, há um templo a céu aberto que congrega e serve grande parte da população: a montanha de 1.500 metros, que dá o nome à localidade e, em parte, integra o terreno da Missão. Aí brota uma nascente e abunda a vegetação, dos miombos às palmeiras. É de uma enorme beleza e não menos utilidade para a sobrevivência: grande parte da população depende desta montanha. O esforço do Padre João Nascimento e da sua comunidade alargada é, neste momento, o de valorizar os recursos, envolvendo as pessoas para que “se sintam protagonistas e possam descobrir e desenvolver a sensibilidade, respeito ou mesmo amor pela Natureza, como dom à nossa disposição, que devemos saber merecer e cuidar.” Infelizmente, a população nem sempre mostra este respeito. Tem sido recorrente o abate descontrolado de árvores. Na montanha, as pessoas encontram lenha para uso doméstico, para preparar os alimentos, mas também para a produção e venda de carvão, muitas vezes à beira da estrada. A população tem aumentado bastante e o uso dos recursos da floresta também. Como a população tem dito ao Padre João, o ciclo das chuvas começa a ressentir-se. Progressivamente, verifica-se a carência de água: a chuva chega mais tarde e com maior intensidade. Por outro lado, as terras são esgotadas e, frequentemente, são feitas queimadas descontroladas. Nisto resulta, pouco a pouco, a “desertificação de espaços imensos”.
“As consequências desta falta de planeamento, de controlo e de acompanhamento, juntamente com as alterações climáticas são efetivamente graves. É um problema social. O grito de alerta da Igreja, com a encíclica Laudato Si, move-nos neste sentido.” De facto, em Massangulo, a problemática ambiental é uma necessidade premente, diária e inescapável. “Esta é uma comunidade resiliente. Procura adaptar-se diariamente aos desafios ambientais e de pobreza”, que, neste caso são indissociáveis. Por essa mesma razão, a Missão tem envolvido sobretudo os jovens em campanhas de reflorestação e criação de viveiros de árvores. Também disponibiliza os terrenos aráveis (as machambas) a quem demonstra interesse e cuida. Um exemplo incontornável é o senhor Fernando Manuel, pedreiro, carpinteiro e “machambeiro” de Mecuburo, Nampula. Veio para o Niassa em 1983 quando ficou órfão, aos vinte anos, para viver com o tio e, quando se casou, cuidou da Missão quando esta ficou sem padres missionários. Hoje é animador da paróquia: visita as diferentes comunidades à volta de Massangulo e presta-lhes apoio. Nos últimos tempos tem tido um papel fundamental no desenvolvimento dos espaços em redor da sua machamba, que abriu no mato cerrado: construiu um parque com mesas e bancos, um poço, uma capela e o canal do riacho sobre o qual estava a reforçar uma ponte, quando o encontrámos. “Quando estou na machamba, sinto-me à vontade. Apesar de trabalhar sozinho, quando pego na enxada, nunca me canso.” Semeia milho, alface, cebolas. Dá para alimentar os seus filhos. Para proteger a machamba dos animais construiu uma vedação de paus maticados e arame. Nos tempos livres, em sua casa, ainda construiu um forno, um dos poucos em Massangulo, e faz pão também para fora. “Tudo isto faço com muito gosto e com muito amor.”
“As consequências desta falta de planeamento, de controlo e de acompanhamento, juntamente com as alterações climáticas são efetivamente graves. É um problema social. O grito de alerta da Igreja, com a encíclica Laudato Si, move-nos neste sentido.”
Subimos também à montanha. No topo, existe uma nascente de água que, desde a chegada dos Missionários, foi canalizada para a Missão e para a comunidade alargada. Foram criados canais e fontanários, que vão sendo mantidos regularmente e de que a maior parte das pessoas beneficia. A água vai sendo decantada ao longo do curso e é limpa. Assim, a população de Massangulo faz parte dos 5,1% dos habitantes de Ngauma com acesso a fontanário. A maior parte das pessoas no distrito vai buscar água a poços, a maior parte sem bomba, ou ao rio ou lago. O Padre João menciona o desperdício de água causado por algumas pessoas que desviam as águas para os seus quintais, pondo em causa o fornecimento geral. A questão que se põe atualmente é como fornecer água a mais gente, face ao crescimento populacional. Por isso, está em curso uma negociação com um projeto promovido pelo Governo do Japão, de forma a que todos tenham acesso à água e para que todos possam contribuir para sua manutenção.
Ao subir a montanha, conhecemos também o senhor Bwane, muçulmano e grande amigo da Missão. Está a ajudar na abertura de caminhos na montanha, na lógica de valorizar o espaço e os recursos, respeitando-os. Garante que, desde que os trabalhos começaram, menos pessoas têm vindo abater árvores. Alegra-se nesta tarefa, uma vez que os trabalhos remunerados que faz para a Missão ajudam a sua família. Em Massangulo, diz-nos, não há emprego. Fala-nos também da falta de sementes. “O Governo às vezes distribui, mas não é suficiente”. Quando lhe perguntamos quais são as suas grandes alegrias não tem dúvidas, “a chuva!”, e deixa mais uma mensagem: “pedimos a quem for preciso: precisamos de sementes.” O Senhor Bwane tem 9 filhos e 4 netos. Planta milho, feijão e algumas bananeiras.
Quando perguntamos ao Padre João o que seria necessário para Massangulo em termos de políticas, responde-nos: “É preciso criar uma ponte entre diferentes instituições locais e governo, no sentido de refletir em primeiro lugar sobre o que está a acontecer; que recursos temos e que medidas devemos tomar. Estamos já a manter aquilo que temos com o envolvimento da comunidade.” Uma Missão não é um governo nem uma administração, mas já está a fazer bastante por esta população. Talvez não baste trazer sementes ao senhor Bwane. Em Massangulo, vimos como os problemas são sistémicos, mesmo a nível local – que é sempre, de alguma forma, global. Partimos da Missão com o pensamento do Padre João bem presente: “Esta é uma causa comum. O que acontece aqui afeta todos em qualquer parte do planeta” e o que fazemos onde quer que estejamos afeta as pessoas de Massangulo.
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável em destaque:
2.3 Até 2030, duplicar a produtividade agrícola e o rendimento dos pequenos produtores de alimentos, particularmente das mulheres, povos indígenas, agricultores de subsistência, pastores e pescadores, inclusive através de garantia de acesso igualitário à terra e a outros recursos produtivos tais como conhecimento, serviços financeiros, mercados e oportunidades de agregação de valor e de emprego não agrícola.
4.2 Até 2030, garantir que todas as meninas e meninos tenham acesso a um desenvolvimento de qualidade na primeira fase da infância, bem como cuidados e educação pré-escolar, de modo que estejam preparados para o ensino primário.
6.1 Até 2030, alcançar o acesso universal e equitativo à água potável e segura para todos.
8.6 Até 2020, reduzir substancialmente a proporção de jovens sem emprego, educação ou formação.
11.4 Fortalecer esforços para proteger e salvaguardar o património cultural e natural do mundo.
11.7 Até 2030, proporcionar o acesso universal a espaços públicos seguros, inclusivos, acessíveis e verdes, particularmente para as mulheres e crianças, pessoas idosas e pessoas com deficiência.
12.2 Até 2030, alcançar a gestão sustentável e o uso eficiente dos recursos naturais.
15.2 Até 2020, promover a implementação da gestão sustentável de todos os tipos de florestas, travar a deflorestação, restaurar florestas degradadas e aumentar substancialmente os esforços de florestação e reflorestação, a nível global.
15.3 Até 2030, combater a desertificação, restaurar a terra e o solo degradados, incluindo terrenos afetados pela desertificação, secas e inundações, e lutar para alcançar um mundo neutro em termos de degradação do solo.
15.4 Até 2030, assegurar a conservação dos ecossistemas de montanha, incluindo a sua biodiversidade, para melhorar a sua capacidade de proporcionar benefícios que são essenciais para o desenvolvimento sustentável.
15.9 Até 2020, integrar os valores dos ecossistemas e da biodiversidade no planeamento nacional e local, nos processos de desenvolvimento, nas estratégias de redução da pobreza e nos sistemas de contabilidade.