Com esperança até Glasgow

18 Dez, 2019

Agência Ecclesia

Ana Patrícia Fonseca na COP 25

Chegámos à COP 25 – a 25.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (CQNUAC ou UNFCCC, na sigla inglesa) – com esperança. Conscientes de que os ritmos das negociações quase nunca coincidem com a urgência da ação, move-nos sempre a esperança de que algum dia seja diferente. 2019 podia ser diferente. Esperávamos. Os apelos ruidosos de tantos jovens, que clamam por futuro, apenas por futuro. O grito dos pobres que pedem justiça. As Nações Unidas que exigem ambição e urgência. O Papa Francisco que chama à reconciliação e conversão ecológica. O Planeta que vai dando sinais de sofrimento. No início da COP 25 pedia-se empenho, compromisso e ambição a todas as nações ali presentes. 2019, em Madrid, podia ter sido diferente. Mas não foi.

“Tempo de Atuar” – era este o mote da Cimeira. E, em pleno início de Advento, era essa a nossa esperança: que a ação começasse ali. Nos corredores e nas salas de reuniões do enorme Centro de Conferências IFEMA ouviam-se os apelos e os obstáculos. Sentia-se um misto de esperança e desalento. Os dias foram correndo e as negociações terminaram sem as resoluções adequadas à dimensão e à urgência do problema. 2019 podia ter sido diferente…

Seguimos em frente, no rescaldo da Cimeira, com as análises do que se avançou e do tanto que ficou por resolver. Não houve progressos significativos na revisão do Mecanismo de Varsóvia, que prevê formas de cálculo das perdas e danos, de forma a compensar as pessoas afetadas pelas alterações climáticas. Os compromissos para limitar o aquecimento do Planeta abaixo dos 1,5ºC, em comparação com os níveis pré industriais, foram tímidos. Não se concluíram as regras de implementação do mercado de carbono (Artigo 6º do Acordo de Paris).

Seguimos em frente, até Glasgow, onde em 2020 se realizará a COP 26.

Lembro-me da canção Gracias a la Vida, da cantora chilena Violeta Parra. Ironicamente, vem do Chile esta canção, país onde se devia ter realizado a Cimeira, mas que a grave convulsão social transferiu para Madrid. Violeta Parra faz, neste tema, um hino à vida. “Graças à vida que me deu tanto”. E aquilo que Violeta aqui enaltece é o que, tantas vezes, nos passa despercebido, os olhos, os ouvidos, os sons, as palavras, podemos acrescentar os rios, as florestas, os pássaros, os peixes, o dia, a noite… Agradece tudo aquilo que lhe permitiu conhecer e viver o amor, as alegrias e as amarguras. Nesta canção, Violeta afirma descobrir o mundo e interagir com ele através da gratidão do tanto recebido. Talvez seja isto que o Papa Francisco nos queira dizer quando nos apela à reconciliação e à conversão ecológica: cairmos na conta do que nos é dado, aceitá-lo com humildade e gratidão e sermos relação próxima e cuidadora com toda a Criação.

Arrisco dizer que, mais do que vontade política, está a faltar aos governantes das nações um processo de reconciliação e conversão, capaz de entender o combate às alterações climáticas como um processo relacional, de respeito e diálogo, com a Terra e os seus recursos, que nos permita curar o Planeta e assim cuidar da vida que nele habita, que nos foi confiada e da qual é nosso dever cultivar e guardar.

Enquanto tal não acontece, seguimos em frente. Renovamos a esperança. Continuamos a sair à rua. Fazemos eco do grito dos pobres. Consciencializamos e sensibilizamos. Denunciamos injustiças. Falamos com os governantes. E renovamos a esperança. Não sabemos o que acontecerá em Glasgow, na COP 26. Mas seguimos até lá. Fortes. Seguimos movidos pela esperança de que um dia será diferente. Um dia será mesmo.

 

Coordenadora Departamento Educação para o Desenvolvimento e Advocacia Social da FEC

Representante da Plataforma Portuguesa das ONGD na COP 25

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